segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

GAYS COM DEFICIÊNCIA... POR ONDE ANDAM?






    Dia desses, após publicar aqui no blog uma matéria sobre sexo e deficiência intitulada "sim, nós fodemos", fui surpreendido pelo comentário de um rapaz de 19 anos que procurava conhecer um cadeirante. Sexualidade e deficiência é um assunto que acho fantástico e que volta e meia faço questão de trazer para o CENTAURO ALADO, principalmente, porque sei o quanto este assunto é considerado tabu na nossa sociedade. Todavia, falar de deficiência e homossexualidade, é algo mais polêmico ainda, provavelmente, por reunir dois estereótipos de preconceito num só ponto. Tenho muitos amigos gays e muitos amigos com deficiências físicas, mas posso contar nos dedos de uma mão um amigo declaradamente gay e que tenha deficiência. Por isso, compreendi de cara a dificuldade que o rapaz que fez o comentário deve estar tendo para conhecer um cadeirante.
 
    Vivemos num mundo onde a estética e a ditadura do belo e do perfeito imperam. Corpos sarados e esculpidos em academias, bombardeados ou não com anabolizantes e suplementos que prometem maravilhas são o objeto de desejos mais comuns de homens e mulheres, independente de que orientação sexual possuam. Aí, um ponto interessante e que mexe com nossos conceitos: ser sarado não é sinônimo de ter saúde. Ao contrário. Já conheci figuras saradíssimas na academia que entupiram seus rins com proteínas ao ponto de urinarem sangue, tudo em busca de um corpo riscado. Isso não é ser saudável nem física e nem emocionalmente. Também existem os que acham que deficiência é sinônimo de doença. Não, não é. Prova bem evidente disso são nossos atletas paralímpicos que vendem saúde.
 
    Pensando em deficiência e homossexualidade, nos deparamos com um fato que pode parecer  estereótipo, mas que é facilmente comprovado numa balada gay, por exemplo. Dificilmente você encontra gays com deficiência na noite, o que  faz pensar em duas possibilidades: ou os gays são um grupo praticamente isento de deficiências, ou, os gays com deficiência não costumam frequentar esse tipo de local. Não acredito na primeira possibilidade, visto que temos no Brasil quase 24% da população declaradamente possuindo algum tipo de comprometimento físico, intelectual ou sensorial (segundo CENSO 2010).
 
    Logo, os motivos que fazem com que homossexuais com algum tipo de questão física,  intelectual ou sensorial não costumem ir para  a noite, são outros. Podemos pensar nas condições de acessibilidade precária que encontramos mesmo nas grandes cidades. Boates com rampas para cadeirantes ou elevadores para pessoas com mobilidade reduzida não são comuns. Mesmo assim, é difícil ver cegos, surdos ou downs na balada, por exemplo.
 
    Provavelmente, a busca do harmônico, do perfeito e do belo - que nitidamente são critérios importantes no imaginário da noite gay -  seja o fator preponderante dessa escassez de pessoas homossexuais com deficiência em ambientes públicos de diversão. Uma vez  que rapazes com corpos esculturais e com abdomens quadriculados andam sempre em bandos e que procuram outros de natureza física semelhante para uma  noite de diversão ou de sexo, talvez fique um  questionamento de aceitação por parte de quem não se enquadra nesse grupo, sobretudo se houver o fator deficiência no meio de tudo isso.
 
    Não raro, alguém como esse rapaz que procura conhecer cadeirantes e que comentou aqui no blog  é visto como um devoté (termo utilizado para designar a pessoa sem deficiência que busca parceiros com algum tipo de comprometimento motor ou físico). Ou seja, mais uma vez caímos no estereótipo: se você não possuir nenhum tipo de deficiência e desejar sexualmente alguém que não tenha uma perna, um braço ou que ande de cadeira de rodas, será enquadrado na categoria de fetichista. Alguns dirão que o problema é justamente este: o desejo está concentrado numa característica física (deficiência) e não numa pessoa, como se uma coisa pudesse ser  dissociada da outra. Sendo assim, quem tem atração por  negros ou por loiros, também está concentrando seu desejo numa característica física (cor da pele).
 
    De qualquer forma, penso que o mais importante é que as pessoas consigam viver a sua sexualidade, independente da sua orientação sexual e do tipo de deficiência que possuam. Se o desejo do outro estará centrado no nosso conjunto ou apenas em alguma característica nossa, teremos a opção de aceitarmos ou não este tipo de envolvimento. Há quem vá atrás de um par de peitos siliconado, atrás de uma bunda avantajada, de um pênis de proporção cavalar, de uma pele clarinha ou de um par de pernas paraplégicas. Desejo não se explica, se sente. Com respeito e liberdade, tudo se afina.
 
Cristiano Refosco
 

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